segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Conversa de Aeroporto


Volto ao Porto praticamente um ano após nosso retorno ao Brasil. Vou a trabalho, mas não deixa de ser um bom motivo para ressuscitar o "Tripeiros".

Minha viagem começa como sempre: no Galeão, feio e desagradável. Porém desta vez ao menos sem mais surpresas. Das últimas vezes que pisamos no recinto vimos vazamentos gigantescos de água no teto, esteiras que não funcionavam para nos trazer a mala, além de funcionários com piadas de mau-gosto para responder recém-chegados.

Desta vez estou sozinho e para passar o tempo pego o livro "Gigantes do futebol brasileiro", que comprei a pedido de um de meus chefes. Não há espaço para sentar perto do meu portão e me dirijo a um lugar mais amplo, perto de um voo para os Estados Unidos. Abro o livro no capítulo Romário, mas leio pouco. Ao meu lado duas mulheres e um homem começam a conversar sobre a visita ao Rio de Janeiro. Certamente um tema mais interessante.

Os três visitantes não se conhecem e iniciam a conversa por falar como apreciaram a viagem. Elogiam a beleza da cidade e a simpatia das pessoas. Sinto que gostaram sinceramente da estada, mas querem falar mais e estou curioso, embora ainda tentando dar alguma atenção ao Baixinho. Agora eles passam para o inevitável tema entre desconhecidos: o tempo.

"Foi uma pena ter chovido por tantos dias", reclama uma das senhoras. Sem querer, ela abriu caminho para o momento de "malhar o Judas". "As chuvas arrasam tudo, vocês viram como a cidade para?", responde o senhor, de uns 60 anos. A conversa segue com reclamações sobre a infraestrutura da cidade, sobre a organização e mais algumas coisas.

Os locais passam de "simpáticos" para "lerdos". Não acreditam que aceitem parados que as chuvas destruam tudo. "Venho aqui todo ano e é a mesma coisa", diz o único homem do grupo.

Na hora me veio a cabeça a frase típica dos jornais: Choveu em uma noite o previsto para três meses. Claro, a culpa da destruição é da chuva indomável. Não há o que fazer, embora no mínimo deveriam demitir o responsável pelas previsões, já que todo ano acontece a mesma surpreendente tempestade destrutiva.

O papo continua com críticas aos preços: paga-se muito caro pelo que recebemos. Perco algo do diálogo, mas me parece que as duas mulheres alugaram apartamentos para temporada, ou de conhecidos.

Ri disfarçadamente dos comentários. O Rio em muitos momentos me irrita profundamente. O preço estúpido e ilógico das coisas é uma das coisas que mais me irritam.

Finalmente se apresentam entre eles e perguntam também meu nome. Claro que não conseguia mais disfarçar, mas a entrada de um local poderia comprometer a honestidade da conversa e preferi não interferir antes. Além disso meu inglês é cada dia mais precário, mas ao menos isto me surpreende positivamente.

Sou do Rio, vou para o Porto, digo. "Adoro a cidade", me responde uma das senhoras. Muito mais interessante que Lisboa, continua ela, que bebia uma pequena garrafa de vinho. Contou também que já visitou o Porto diversas vezes. Acho engraçado o fato de ter me sentido ligeiramente orgulhoso com a comparação. Algo instintivo, como a reação esperada ao dizer a qualquer carioca que o Rio é melhor que São Paulo, mesmo que este goste dos vizinhos.

Os três já conversaram sobre o tempo. Nenhum deles deve sequer acompanhar futebol, quanto mais torcer para algum clube carioca. Meu arsenal de conversas de elevador chegou ao fim antes de ser utilizado. Mas descubro que o homem é professor universitário e tem um amigo que vive em Botafogo, por isso vem sempre aqui. Falamos de universidades, da possibilidade de ele passar alguns anos dando aulas no Rio. Um pouco sobre jornalismo e futebol. Ele prefere o nosso futebol ao deles, embora não acompanhe nenhum. Defendo a filosofia do sofrimento futebolístico, da espera pelo momento único de explosão, em contraponto ao entretenimento e diversão de esportes com muitos pontos.

Hora de me despedir do Galeão e seguir para o Porto. Ao chegar, serei recebido em um aeroporto. O do Rio está mais para rodoviária.